Acusações contra o Talmud são um fenômeno antigo na história do mundo. Mas, não tão antigo assim. Foi a partir do século XIII, quando os associados da Inquisição tentaram difamar os judeus e sua religião para justificar roubos e assassinatos contra populações judaicas. É com este tipo de motivação que temos as primeiras manifestações contra o Talmud.
[Para saber mais, pesquise a obra de Yitzchak Baer, A History of Jewish in Christian Spain , vol. I pp. 150-185]
O material inicial compilado por pregadores cristãos como Raymond Martini (1215-1285) e Nicholas Donin (judeu convertido ao Catolicismo no início do século XIII) permaneceu, como se fosse uma base de todas as acusações subsequentes contra o Talmud usadas hoje, por grupos cristãos neonazistas, grupos fascistas na direita conservadora em diversos países, e grupos fundamentalistas islâmicos.
Como somos um grupo de estudos crítico e racional, quem participa sabe que nossa abordagem dos textos tradicionais não é pautada em "coleguismo". Existem críticas reais e verdadeiras para se fazer em todos os textos antigos e especialmente, no discurso de rabinos Ortodoxos atuais.
Porém, as acusações de cristãos, cristãos fascistas, neonazistas, islâmicos fundamentalistas e pessoas que simpatizam com tais ideologias são, na maioria dos casos, falsos e/ou baseados em citações tiradas do contexto. Existem até invenções completas.
[Sim, e isso desde o século XIII, conforme Baer, no capítulo 4 f. 54, 82 demonstra que Raymond Martini falsificou textos que disse que eram "citações"]
Hoje, na internet, podemos encontrar muitas dessas velhas acusações sendo refeitas para promoção de antissemitismo, promover ideologias supremacistas brancas, neonazismo e neofascismos. Mas, a "culpa" não é da "Internet" obviamente. Aqui, faremos um compilado de tudo isso, e observações da nossa parte.
Acusações contra o Talmud podem ser divididas em quatro categorias principais:
[ver a obra de Hyam Maccoby, Judaism on Trial , pp. 23-38]
1] O Talmud se considera mais sagrado do que a Bíblia
2] O Talmud contém passagens que são blasfemas contra Jesus e Maria
As duas primeiras acusações são essencialmente tolas, como quase todo antissemitismo cristão.
O que importa a cristãos se o Talmud judaico for considerado por Judeus mais sagrado do que a Bíblia? Não é a religião deles! Não é o sistema tradicional deles! Portanto, não importa para eles.
Note então que acusar os judeus de "blasfêmia" era apenas um meio de se procurar justificativa para cometer roubos e assassinatos, com a aprovação do Estado cristão...
E se os judeus não consideram o chamado 'novo' Testamento como, nem mesmo correto historicamente, e daí?
Para os cristãos fundamentalistas, TODAS as outras religiões são consideradas blasfemas. Isso é visto por todos os povos indígenas assassinados, povos africanos escravizados, e populações judaicas, romani, e de vertentes diversas do próprio cristianismo posteriormente - mortos por causa do fanatismo deles.
Por que então, o Talmud especificamente deveria ser julgado, como se estivesse 'dentro da estrutura religiosa cristã'? Não está.
Embora exista muita semelhança entre o movimento da Cabalá e do Misticismo Judaico, com o Cristianismo, a religião Judaica não é uma vertente do cristianismo - é o contrário: O cristianismo é uma seita do Judaísmo. Portanto, eles não são "a regua" por meio da qual, se faz as medições, do que é "blasfêmia" ou do que não é...(se fosse o caso)
Claro, qualquer livro judaico será considerado "blasfemo" dentro dessa estrutura religiosa particular, porque o Judaísmo NÃO ACEITA a personagem Jesus como o messias, nem como deus. Se o "judeu" individualmente se converter para esta, ou qualquer outra religião, isso não faz diferença. A Tradição Judaica rejeita a narrativa cristã. Ponto.
A própria acusação de que o Talmud Judaico "blasfêma contra o Cristianismo" é redundante e sinal de estupidez.
3] O Talmud tem declarações ridículas e imorais
A terceira acusação aponta para um problema, que judeus teriam que resolver entre si. Não interessa para quem não faz parte desta tradição. Na verdade, as declarações supostamente tolas e imorais no Talmud - dentro das acusações dos antissemitas em geral - às vezes são inexistentes, mas geralmente são textos que eles nem compreenderam, como era de se esperar. Você já viu algum supremacista neonazista minimamente inteligente? Nem eu...
O Talmud e a literatura associada, desenvolveram todo um gênero literário próprio. Possui seu próprio modo de expor parábolas e ditos alegóricos que, quando compreendidos por quem estuda, lançam luz a reflexões relacionadas aos mistérios da vida.
No entanto, quando traduzidos por fascistas cristãos, deturpados e retirados de seu contexto por fundamentalistas islâmicos (por causa do atual conflito no Estado de Israel), os materiais parecerão tolos como seus deturpadores...
4] O Talmud tem leis que são racistas e anti-gentias
Como os judeus ortodoxos de hoje ainda tentam levar suas vidas com base nas leis contidas no Talmud, caberia aos judeus (ortodoxos e principalmente os não ortodoxos, que são maioria) entender e explicar, como se deve interpretar suas leis religiosas, e definir se são ou não racistas, ou se são ou não depreciativas para os não judeus.
A lei judaica clássica, conforme contida no Talmud, trata os não Judeus com uma ideia de respeito, devido a nutrir que cada pessoa foi criada 'à imagem Divina'. Esse é um fato simples. Propriedades e vida de não judeus são respeitadas e quaisquer (errôneas) citações do Talmud que indiquem o contrário, precisam ser vistas em sua língua e contexto originais, pois, na maioria são acusações de sites "neonazistas cristãos" ou fundamentalistas islâmicos - sempre no objetivo de fomentar e justificar violência, roubo, assassinato ou, atentados cometidos contra Judeus.
Mesmo que um leitor sério do Talmud, acreditasse que "tal e tal" citação do Talmud foi "racista" e se os judeus sempre as compreenderam de maneira diferente (discordando desse tal intérprete), então os judeus não podem ser considerados racistas por causa do trecho!
Da mesma forma que a Bíblia Hebraica, tem "cenas" como a de Avraham quase sacrificando Itzhak, mas aquilo NUNCA foi interpretado, como se fosse indicação de que, sacrificar os filhos seria algo bom. O texto poderia ser acusado (e é) de ser "à favor do sacrifício de crianças", mas os Judeus não podem ser acusados disso. Questão de raciocínio!
Mesmo que alguém pudesse torcer as palavras do Talmud para serem lidas como se fossem odiosas, se os judeus sempre entenderam o Talmud de uma forma não odiosa, então o argumento do acusador não tem sentido. O verdadeiro exercício seria encontrar a influência talmúdica (supostamente racista) sobre os judeus e o Judaísmo e, examinar atentamente a literatura pós-talmúdica - ou seja, como tal texto foi compreendido com o passar do tempo - para se descobrir claramente, se essa influência talmúdica seria mesmo racista.
Então, o Talmud é "racista" ou seria pelo menos "anti - não judeu"? Não. Não é.
Só que é o seguinte colega, preste atenção:
O TALMUD NÃO É UM MANIFESTO UNIVERSALISTA.
Ou seja, o Talmud não foi usado para escrever as declarações dos Direitos Humanos que existe (e é totalmente ignorada) hoje. O Talmud é um documento religioso, escrito por aqueles da Religião Judaica para outros da mesma Tradição e Religião. O Talmud lida e favorece o Judaísmo, toda vez que fala em relação a outras religiões (duh! obviamente) e estabelece regras, sobre como seria viver (de modo utópico) numa sociedade "judaica" (tal qual, "Judaico" era entendido pelos rabinos da época) numa sociedade mista. O Talmud legisla sobre como criar Comunidades Judaicas vibrantes e, ao mesmo tempo, como manter o respeito pela sociedade não judaica em torno. As sociedades em torno (cristianismo e seu modelo de sociedade são provas disso) no mundo antigo eram muito violentas, propensas a todo tipo de crime, por mera justificativa religiosa (como os antissemitas atuais). Era preciso lidar com isso, com cuidado.
Universalismo, seria o desejo de que todos fossem tratados da mesma forma e vivessem em comunidades não denominacionais.
No entanto, o Talmud é uma obra que começa a ser criada no Século III da era comum. Portanto, esta obra se preocupa com a sobrevivência da Tradição Judaica, que era o que estava ameaçado na época. E lida com o respeito pela humanidade que não segue (nem é obrigada a seguir) a religião Judaica.
Aliás, é NOSSA RELIGIÃO QUE RESPEITA O DIREITO DE PESSOAS DE NÃO SEGUIR O JUDAÍSMO. Diferente do Cristianismo, nós NÃO CONDENAMOS ao chamado "Inferno eterno" os não judeus, por não acreditarem na nossa religião. Isso por si só, diz muito sobre os acusadores, que fazem exatamente isso (tanto cristãos, como islâmicos fundamentalistas...)
O Talmud lida com a necessidade da sobrevivência da tradição judaica ao longo de milhares de anos de condição de minoria perseguida e sujeita aos psicopatas no poder.
O que se demonstra quando se estuda, é que a consideração pela comunidade judaica NUNCA relega aqueles de fora desta comunidade, a um status desumano.
As mentiras anti-talmúdicas são exatamente isso então: MENTIRAS. Nenhuma novidade.
A sabedoria do Talmud sustentou o Judaísmo por milhares de anos e talvez seu próprio sucesso seja o que gerou tanto ódio pois, foi o Talmud e sua sabedoria que impediu que a maioria dos Judeus abandonasse a tradição para se converter ao Cristianismo ou ao Islamismo.
E como estes quiseram (e querem) "forçar" pessoas a seguir suas religiões, demonstraram-se indignados contra aquilo que impedia que sua ideologia fosse aceita. Qual a saída que encontraram? A Difamação.
UMA ACUSAÇÃO
Moed Katan 17a. Se um judeu é tentado a praticar o mal, ele deve ir para uma cidade onde não seja conhecido e fazer o mal ali.
O texto:
מַאי טַעְמָא דַּעֲבַד כְּרַבִּי אִילְעַאי דְּתַנְיָא רַבִּי אִילְעַאי אוֹמֵר אִם רוֹאֶה אָדָם שֶׁיִּצְרוֹ מִתְגַּבֵּר עָלָיו יֵלֵךְ לְמָקוֹם שֶׁאֵין מַכִּירִין אוֹתוֹ וְיִלְבַּשׁ שְׁחוֹרִים וְיִתְעַטֵּף שְׁחוֹרִים וְיַעֲשֶׂה מַה שֶּׁלִּבּוֹ חָפֵץ וְאַל יְחַלֵּל שֵׁם שָׁמַיִם בְּפַרְהֶסְיָא
A Guemará pergunta: Por que ele foi aceito ali? A Guemará responde: Mesmo tendo errado, ele ainda agiu de acordo com a opinião do rabino Ilai, como foi ensinado num baraita : O rabino Ilai disse: Se uma pessoa vê que seu instinto está ganhando controle sobre si e ela não puder superar; então deve ir para um lugar onde ele não é conhecida. Ele deve usar preto e deve cobrir sua cabeça de preto, como se estivesse de luto. Talvez essas mudanças o influenciassem, para que não errasse. Mesmo que essas ações não ajudassem, a pessoa deveria pelo menos fazer o que seu coração deseja em particular - se não tiver outro jeito - e não profanar o nome dos Céus em público. Embora essa pessoa tenha errado, ele feria aquilo em particular e de uma maneira que não profanasse publicamente o nome Divino e, portanto, era melhor que ela recebesse um sepultamento honroso.
Observe a parte da passagem que não é citada na acusação.
Os acusadores não mencionaram que essa pessoa (não necessariamente um israelita) deveria se vestir de preto e cobrir a cabeça, como se estivesse de luto.
Por que teste texto deveria ser interpretado, como se o Talmud estivesse oferecendo conselhos sobre como cometer um crime? Muito pelo contrário, a "pessoa" do exemplo, deveria tentar se misturar com todas as outras pessoas, em estado de luto. O que tal estado provoca? Contato com as pessoas, tentativas das pessoas que o consolarem ou perguntarem se está tudo bem.
O Talmud está oferecendo conselhos - que hoje chamaríamos de cunho psicológico - muito sólidos. Não é dito diretamente a essa pessoa em crise: "Você não pode fazer isso".
Esse conselho para uma pessoa impregnada de algum desejo, não teria nem sentido, nem efeito; porque a pessoa a esta altura, já perdeu o controle de suas ações. E os sábios estavam observando a natureza humana nesta condição.
Em vez disso, a pessoa foi aconselhada, convidada, a primeiro adiar suas "ações pretendidas". De que modo? Indo para uma outra cidade, onde ele não é conhecido. Neste mundo aqui, não existia "transporte público", nem "ônibus"... A pessoa para ir numa outra cidade, tinha que ir a pé, caminhar quilômetros e em campo aberto ainda por cima...
Esta longa viagem serviria como um período de reflexão.
Aquela pessoa então, foi instruída ainda por cima, a "se vestir" como se estivesse de luto, com humildade, o que deve servir como um lembrete, do que ele era em comparação com o que planejava fazer.
Em vez de estar oferecendo "permissão", ou "carta branca" para pecar, o Talmud estava na verdade sugerindo uma forma de repreensão indireta para justamente, impedir a pessoa de pecar.
[E foi assim mesmo que o texto foi entendido na antiguidade, como se vê do que o Rashi no nome de Rav Hai Gaon e o texto do Hidushei HaRan falaram; e também Tossafot, Kidushin 40a].
A menção da 'profanação do nome de Divino' foi um subterfúgio argumentativo, para convencer esse indivíduo imaginado, de sair de seu estado doente a voltar para o caminho da saúde mental.
UMA OUTRA ACUSAÇÃO
Ievamot 11b: "A relação sexual com uma menina é permitida se ela tiver três anos de idade."
Avoda Zarah 37a: "Uma garota gentia de três anos pode ser violada."
O texto está obviamente citado errado, pois tal texto não existe ali:
גְּמָ׳ אָמַר רַב יְהוּדָה אָמַר רַב קָטָן הַבָּא עַל הַגְּדוֹלָה עֲשָׂאָהּ מוּכַּת עֵץ כִּי אַמְרִיתַהּ קַמֵּיהּ דִּשְׁמוּאֵל אָמַר אֵין מוּכַּת עֵץ בְּבָשָׂר
GUEMARÁ: O rav Iehudá disse que o Rav havia dito: Um קָטָן pequeno ou seja, alguém considerado menor que 13 anos e um dia, que teve relações sexuais com uma גְּדוֹלָה grande, ou seja uma "mulher" aos 12 anos e um dia - que era considerada apta para casar naquelas sociedades - era vista, neste caso, como alguém cujo hímen tinha sido rompido por um pedaço de madeira. Ou seja, a relação deles neste exemplo, não seria válida para determinar que ela não era mais virgem. Já que esse ato não em si, não era considerado uma 'relação sexual completa': O rav Iehudá continua: Quando eu declarei esta regra perante Shmuel, ele me disse : Uma grande (a menina do exemplo) não alcança o status de alguém cujo hímen foi rompido por madeira (o ato sexual inválido) nem por meio da carne, isto é, nem por meio da relação sexual ilustrada, com "o pequeno" o menor de 13 anos e um dia.
Enquanto aqueles que não estão acostumados com essas discussões talmúdicas podem ser pegos de surpresa pelo uso de eufemismos, a discussão aqui se refere ao dote para virgens e não-virgens.
No mundo antigo, uma virgem recebia quando casava, um dote maior. Embora o sinal revelador da virgindade fosse a liberação de sangue devido ao rompimento do hímen na noite de núpcias, existia ocasiões em que o hímen já tinha sido rompido por acidente, como quando a mulher sofreu um ferimento.
O Talmud aqui acrescenta uma cena, que ilustra um caso. Um caso em que um ato sexual com um menor do sexo masculino (chamado "o pequeno") não era considerado pelos sábios, uma "perda de virgindade" para a menina envolvida, porque um dos participantes não seria considerado totalmente ativo (como um pedaço de madeira).
Embora o hímen pudesse ter sido rompido por este ato ilustrado, eles decidiam que, se deveria considerar que "ela nem se envolveu", no que poderia ser classificado - dentro da Halahá" - como um ato sexual. Portanto, uma situação assim, não poderia ser usada para "acusar" a menina, de não ser "virgem" afetando o status do dote.
Eles não estavam lidando com a questão do abuso infantil. Nem estavam falando de relações de adultos e crianças obviamente. O "adulto" para os sábios, nestes temas, era o menino "recém" adulto (13 anos e um dia), o qual era considerado, quase no mundo todo em tempos antigos, como "apto ao casamento". E a "mulher" também, 12 anos e um dia, era considerada "apta ao casamento", com um menino de idade equivalente. Desde a criação da concepção de infância (a partir dos séculos XV, XVI e XVII), a prática sobre a "idade de casamentos" mudou drasticamente, em todas as culturas E NA JUDAICA TAMBÉM. Não são Judeus que "casam meninas com adultos" no Oriente Médio, são Muçulmanos que fazem isso!
O Talmud continua dizendo, que um ato sexual entre um adulto do sexo masculino (o menino de 13 anos e um dia) e uma "pequena" - ou seja, supondo uma menina com menos de três anos, também não era considerado uma perda de virgindade (embora fosse abuso). Como a menina era considerada para eles, muito jovem para que seu hímen fosse quebrado, ela ainda deveria ser considerada virgem, quando fosse se casar. Aquele "incidente" ocorrido a anos atrás (hipoteticamente) não poderia ser usado, para tirar dela o direito de dote de virgem.
Em nenhum lugar no Talmud o tal comportamento foi permitido.
Toda a ideia de sexo, fora do contexto do casamento foi estritamente proibido na moralidade da época (e no século XII Maimonides legisla esse entendimento no seu código, Mishneh Torah , Hil'hot Ishut 1 : 4, Hil'hot Na'arah Betulah 2 : 17; Shul'han Aru'h, Even HaEzer 26 : 1, 177 : 5) como era este caso, que obviamente é descrito hoje como abuso infantil. Mas, o Talmud estava apenas discutindo situações hipotéticas, 'post facto', com as preocupações da época (validade ou não, do dote) sobre o que aconteceria se tal caso surgisse.
O mesmo uso ocorre na passagem do Talmud Avodah Zarah 37a:
הואיל וראוי לביאה מטמא נמי בזיבה אמר רבינא הלכך הא תינוקת עובדת כוכבים בת ג' שנים ויום אחד הואיל וראויה לביאה מטמאה נמי בזיבה פשיטא מהו דתימא האי ידע לארגולי והא לא ידעה לארגולי קמ"ל
A Guemará explica a razão para esta opinião: Desde que, um menino de nove anos de idade, esteja apto a participar de uma relação sexual, ele também transmitiria impureza ritual como aquele que experimentou זיבה Zivá. O sábio Ravina disse: Portanto, em relação a uma criança de idólatras do sexo feminino que fosse de três anos e um dia de idade, desde que ela estivesse apta a se envolver em relações sexuais nessa idade, ela também transmitiria impureza ritual como aquele que experimentou זיבה Zivá. A Guemará pergunta: Não é óbvio? A Guemará explica: Era necessário declarar esta regra, para que você não dissesse que a halahá de um idólatra que seria haláhicamente apto para relações sexuais transmitiria impureza ritual, não se aplicaria a um idólatra do sexo feminino. A possível diferença entre o exemplo da criança idólatra do sexo masculino e do feminino era baseada, no fato de que, enquanto aquela criança, um não judeu de nove anos de idade, saberia como acostumar os outros ao erro usando a persuasão, esta criança, a não judia de três anos, não saberia como acostumar os outros ao erro até que amadurecesse. Portanto, Ravina nos ensinou que a halahá entretanto, se aplicaria aos casos do sexo masculino e feminino: ambos transmitiriam impureza ritual.
O Talmud discute a transmissão de impureza ritual em casos que, em geral, não se aplicaria a regra de impureza ritual.
O sexo é transmissor de impureza ritual, tornando a pessoa Záv ou Zavá.
Mas, não Judeus não são afetados pela questão de impureza ritual. Na cena hipotética, se afirma que, conforme o imaginário da época, já aos três anos uma menina seria considerada (a mínima idade possível, é o que está sendo considerado) naquela época (pelos idólatras) como capaz de participar num ato sexual para então, se poder discutir a questão de se transmitir ou não, impureza ritual.
A Halahá discute as questões em termos "mínimos" em todas as situações. O mínimo de quantidade considerado "alimento" é um Kezait (volume de azeitona ou ovo). O mínimo do espaço particular, é 4 Amot (4 passos em torno de si). O mínimo da construção espaço neutro (de Shabat) é 3 Tefahot de altura, e assim por diante.
E do mesmo modo, o "mínimo" de onde se começaria "a transmitir impureza ritual via sexo", seria 3 anos por existirem notícias de povos naquela época com tais práticas. Tanto não é aprovação de prática que o ato é discutido usando exemplo "de idólatras", indicando que israelitas nem pensar. Mesmo assim, não era uma "acusação" de que faziam aquilo. Mas, um caso hipotético baseado em rumores da época.
No entanto, na Halahá isso não reflete um ato permitido jamais.
Por isso os sábios disseram que um "menino idólatra" de apenas 8 anos, já seria considerado "capaz" de fazer algo de cunho sexual - não por si mesmo, é claro - mas porque, era instruído e induzido pelos adultos ao seu redor a isso. Não que a criança "fosse" naturalmente fazer nada.
UMA OUTRA ACUSAÇÃO
Sinédrio 59a: "Um goy (gentio) que se intromete na Lei (Talmud) é culpado de morte."
O texto:
ואמר ר' יוחנן עובד כוכבים שעוסק בתורה חייב מיתה שנאמר (דברים לג, ד) תורה צוה לנו משה מורשה לנו מורשה ולא להם וליחשבה גבי שבע מצות מ"ד מורשה מיגזל קא גזיל לה מאן דאמר מאורסה דינו כנערה המאורסה דבסקילה מיתיבי היה ר"מ אומר מניין שאפילו עובד כוכבים ועוסק בתורה שהוא ככהן גדול שנאמר (ויקרא יח, ה) אשר יעשה אותם האדם וחי בהם כהנים לוים וישראלים לא נאמר אלא האדם הא למדת שאפילו עובד כוכבים ועוסק בתורה הרי הוא ככהן גדול
E o rabino Ioḥanan disse: Um עובד כוכבים adorador de estrelas = idólatra que se dedicar ao estudo da Torá, estaria sujeito a receber a pena capital pelas mãos dos céus; como está dito: “A [תורה Torá] que nos ordenou Moshe, é uma herança da congregação de Iáacov” (Devarim 33 : 4), indicando que seria uma herança "para nós" [que admitimos o divino] e não "para eles" [que cultuam estrelas e constelações]. A Guemará desafia o argumento: Mas se fosse assim, que o taná contasse esta proibição, entre as Sete Mitzvot dos Bnei Noah. Assim, eles instruiriam os idólatras de seu meio, a não se ocuparem com a Torá! A Guemará explica: De acordo com aquele que diz que o verso se refere "à Torá", como uma herança, esta proibição já estaria incluída na proibição contra o roubo das Sheva Mitzvot Bnei Noah, já aquele membro das nações que se ocupa com a Torá estaria roubando ela do povo judeu. E de acordo com aquele que diz que o verso se refere à Torá como prometida, já que a grafia da palavra hebraica para "prometida" [מאורסה me'orassa], é semelhante à da palavra para "herança" [מורשה morashá], a punição de um membros das nações que se ocupasse com a Torá, seria simbolicamente tão séria como daquele que manteria relações sexuais com uma jovem noiva, que era a execução por apedrejamento. A Guemará levanta uma objeção à declaração do rabino Ioḥanan de um baraita : O rabino Meir discordava e dizia: De onde é derivado, que até mesmo um עובד כוכבים adorador de estrelas = idólatra que se dedicasse ao estudo da Torá seria considerado, tão respeitável como um Sumo Sacerdote? Seria derivado do que o que é afirmado: “Você deve, portanto, guardar os meus estatutos e os meus juízos, que se um homem os fizer, viverá por eles” (Vaicrá 18 : 5). Perceba que não foi escrito: Se sacerdotes, levitas e israelitas o fizerem (ou seja, apenas o povo Israelita), eles viverão por eles. O que foi escrito foi : האדם - HaAdam = “o homem”, que indicaria que a humanidade em geral estaria incluída nisso. Você, portanto, aprende que mesmo um עובד כוכבים adorador de estrelas = idólatra que se dedicasse ao estudo da Torá seria considerado como um Sumo Sacerdote.
Como se vê na discussão, o Talmud fornece uma análise da contradição, entre duas declarações sobre se um idólatra teria "permissão" (dentro da Halahá) para "se ocupar" com a Torá, ou seja, estudar profundamente, todos os pormenores da Torá como fazem os rabinos. Por que isso é discutido? Porque o Judaísmo é a única religião da qual tomaram os textos religiosos e inventaram a partir deles, religiões contraditórias a própria tradição que preservou estes mesmos textos. Talvez, por isso...
A acusação cita apenas um lado e não fornece a resolução do restante do texto. Ao ver todo o texto e a resolução, podemos entender melhor a intenção do Talmud.
O que a acusação também não cita é a passagem imediatamente anterior à essa.
O Talmud afirma que era proibido para um idólatra observar Shabat e os feriados judaicos imitando um Judeu em sua prática religiosa, dizendo:
ואר"ל עובד כוכבים ששבת חייב מיתה שנא' (בראשית ח, כב) ויום ולילה לא ישבותו ואמר מר אזהרה שלהן זו היא מיתתן אמר רבינא אפי' שני בשבת
E Reish Lakish disse: Um עובד כוכבים adorador de estrelas = idólatra que observasse o Shabat estaria sujeito a receber a pena capital pelas mãos dos céus, como está dito: “E o dia e a noite não cessarão” (Bereshit 8 : 23), o que significa literalmente: E dia e noite eles não devem descansar "para eles". Isso é interpretado homileticamente para implicar que, os Bnei Noah não poderiam inventar um "dia de descansar" como o Shabat. E o Mestre disse (no Daf 57a) que tal proibição seria passível de pena capital pelas mãos dos céus, uma punição já associada com as Sheva Mitzvot Bnei Noah. E Ravina disse: Se um Bne Noah observar, nem que for 'um dia de descanso' (inventando um "Shabat") em qualquer dia da semana, mesmo que não seja reservado para o culto, por exemplo, em uma segunda-feira, ele é responsabilizado pela regra que proíbe "Inventar religião".
Embora essas observações, não pareçam tão conspiratórias quanto a "proibição de estudar a Torá", ainda assim, é uma declaração curiosa. Nem essa proibição, nem a outra (proibido ocupar-se com Torá ou proibido guardar o Shabat) jamais - em toda história da humanidade - fizeram Judeus cometer ato nenhum contra absolutamente ninguém. Islâmicos assassinaram chargistas por causa de desenhos considerados "ofensivos". Cristãos cometeram inúmeros atentados "em nome de cristo" e, nunca houve um caso de Judeus atacando pessoas por quaisquer dos casos citados. O motivo é simples: Não se trata do que os acusadores estão dizendo.
Porque o caso é digno da nossa atenção então? Porque a explicação está ligada a uma resolução do Talmud, procurando resolver uma contradição entre declarações do rabino Iohanan e o rabino Meir.
O Talmud conclui que ambos os rabinos concordavam de um modo geral, mas um afirmava que um idólatra deveria ser "proibido" (pela lei judaica) de "estudar as partes da Torá que discutem os mandamentos relacionados especificamente aos judeus" (o tal "ocupar-se com Torá"); e o outro afirmava que um idólatra seria altamente elogiado, se por acaso viesse estudar "as partes da Torá que discutem o mandamentos que se relacionam com ele": As Sete leis de Noah.
Em outras palavras, um idólatra, no que foi imaginado, deveria se preocupar com seu papel no mundo e se procurasse a sabedoria da Torá, que fosse para algo prático e que fizesse mesmo diferença.
Ele deveria buscar ativamente aprender aquilo que fosse útil imediatamente, e que tentasse se elevar aos níveis humanos mais elevados. No entanto, como um membro das nações, deve se limitar a SUA função e não inventar outra religião, e tentar assumir a função de outra pessoa.
Quando ele começasse a estudar sobre os Mandamentos Judaicos e a observar os feriados judaicos, ele estaria só "Imitando o Judaísmo". Isso - ao contrário de outras religiões - não era algo bem visto. O papel da tradição Judaica NÃO É COLONIZAR o outro. NÃO É fazer ele virar da nossa religião!
Uma pessoa das nações, não deveria acreditar que DEIXAR DE SER O QUE É seria melhor para ele. Ele deveria saber que no seu papel de membro dos povos, deve ser vivido como um justo. É deste modo que ele estaria colaborando com a missão judaica.
Para os sábios, era muito impróprio para um membro das nações simplesmente fingir que seria judeu, e daí "inventar um novo Judaísmo", e começar a atuar isso no mundo. Ao inventar uma nova religião, ele estaria deixando de ser um membro justo das nações, pois estaria mentindo.
A ideia dos rabinos é que, todos nós temos nossos papéis no mundo. Ninguém precisa "virar" nada. E é errado tentar contornar esses papéis.
Um membro das nações, que achasse que "o melhor jeito de viver" (qualquer que seja sua justificativa) seria o "Judaico", poderia se converter e viver deste modo, SEM PRECISAR MENTIR.
Mas, um membro justo das nações era já considerado assim, pelos próprios méritos, pelas próprias boas ações. E por isso, de acordo com a tradição, seria proibido de tentar passar por cima de seu papel.
UMA OUTRA ACUSAÇÃO
Talmud Erubin 21b. Todo aquele que desobedece aos rabinos merece a morte e será punido sendo fervido em excremento quente no Inferno.
O texto:
״וְלַהַג הַרְבֵּה יְגִיעַת בָּשָׂר״ — אָמַר רַב פָּפָּא בְּרֵיהּ דְּרַב אַחָא בַּר אַדָּא מִשְּׁמֵיהּ דְּרַב אַחָא בַּר עוּלָּא: מְלַמֵּד שֶׁכׇּל הַמַּלְעִיג עַל דִּבְרֵי חֲכָמִים, נִידּוֹן בְּצוֹאָה רוֹתַחַת. מַתְקֵיף לַהּ רָבָא: מִי כְּתִיב לַעַג? ״לַהַג״ כְּתִיב! אֶלָּא: כׇּל הַהוֹגֶה בָּהֶן טוֹעֵם טַעַם בָּשָׂר.
Qual é o sentido das palavras: “E muito estudo [לַהַג lahag] é um cansaço da carne”? O rav Pápa, filho do rav Aḥa bar Ada, disse em nome do rav Aḥa bar Ula: Isso ensina que, quem zombar [מַּלְעִיג malig] das palavras dos Sábios, será sentenciado a excremento fervente, que resultava do "cansaço da carne" do homem. Rava se opunha fortemente a esta explicação, e dizia: Por acaso está escrito: Zombar [לַעַג la'ag]? Não! O Termo “לַהַג Lahag ” é que foi escrito! Em vez disso, o verso deveria ser entendido da maneira oposta: Quem quer que medite [הוֹגֶה hogeh] sobre as palavras deles, as palavras dos Sábios, experimenta o prazer como se tivesse provado sabor de carne.
Como se nota facilmente o baixo nível intelectual do acusador, ele fez uma má tradução das expressões "zombaria" como se fosse dizer "desobediência". Este erro muda o significado da passagem.
A acusação também esqueceu de apontar que, a afirmação é refutada em seguida! Fosse o que fosse. No entanto, o ponto ainda permanece que, conforme exigido em Devarim 17 : 8 - 13, se diz que deve-se mesmo procurar pelos mestres, para ouvir deles as decisões já que, eram os transmissores da Tradição. Mas, notem que o restante associado a isso, não faz nem sentido.

